Da feira ao diploma: aluno de medicina apresenta trabalho em congresso internacional Conciliando trabalho e faculdade de medicina, Gabriel d...
Da feira ao diploma: aluno de medicina apresenta trabalho em congresso internacional
Conciliando trabalho e faculdade de medicina, Gabriel de Oliveira, 25, é bolsista do Prouni na Uniceplac. O seu tema de TCC, sobre prevenção de AVCs, foi aceito em congresso internacional de cardiologia
Artur Maldaner*

Gabriel Lins de Oliveira, 25 anos, está com uma vaquinha on-line para viabilizar a viagem - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
Aos 25 anos, o estudante de medicina Gabriel Lins de Oliveira alcançou um feito para poucos: vai apresentar um de seus trabalhos em congresso de cardiologia em Nova Orleans (EUA). Nascido em Minas Gerais, ele foi criado em Samambaia Sul pela mãe, copeira, e o pai frentista. Conseguiu ser admitido no disputado curso graças a uma bolsa do Programa Universidade para Todos (Prouni), no Centro Universitário Uniceplac. Um acidente familiar inspirou a pesquisa sobre prevenção de AVCs, hoje reconhecida internacionalmente.
Gabriel sonha cursar medicina desde os 13 anos de idade. “Nunca quis outro curso”, atesta. Mas foi apenas no último ano do ensino médio que levou a ideia de ser médico com mais seriedade, enquanto estagiava para ajudar a família financeiramente. Por ser o irmão mais velho da família, Gabriel sempre trabalhou para ajudar nas finanças, inclusive, enquanto estudava para o vestibular de medicina. Além dos pais, moravam na pequena casa de dois quartos suas duas irmãs, de 2 e 20 anos, a avó, e o irmão, de 19 anos, que já saiu de casa.
Durante quatro anos, o jovem trabalhava enquanto estudava para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). “Em 2020, eu trabalhava em uma padaria. Estudava bem cedo, ia para a padaria, voltava, e estudava até a noite, o ano todo. Então, fiz o Enem e tirei uma nota muito boa, foram 730 pontos. Fiquei com expectativa de ser aprovado. Olhando as notas de corte das faculdades, eu senti que passaria como bolsista com cotas”, lembra. Por causa da pandemia de covid-19, porém, a chamada do Enem ficaria para o primeiro semestre de 2021. O estudante esperou a aprovação, mas não conseguiu: “Nem em federal, nem particular. Acabei desistindo”
ma pausa nos estudos e passou a atuar como instalador de câmeras nos Correios, viajando pelo Brasil. Decidiu usar de novo a nota no Sisu e no Prouni, para o segundo semestre de 2021 e, em setembro, veio o resultado da aprovação para a Uniceplac e a Universidade Federal da Bahia. Gabriel optou, então, por permanecer em Brasília, com bolsa de 100% para o curso dos seus sonhos.
A família questionava a dedicação absoluta. “Minha mãe via que eu já estava cansado de estudar para medicina. Eu cogitei tentar enfermagem em 2020, mas senti que isso não era para mim. Toda vez que eu imaginava outro curso não me sentia realizado”, explica Gabriel, e atribui o amor pela medicina à possibilidade de atender os pacientes de forma humana, além de melhorar a situação financeira da família.
Reconhecimento
O trabalho científico do jovem, que é o tema de seu trabalho de conclusão de curso (TCC), aborda uma lacuna do conhecimento médico: a eficácia da aspirina em comparação a outras estratégias antitrombóticas (que combatem a formação de coágulos sanguíneos), na prevenção de acidente vascular cerebral (AVC). A preocupação de Gabriel com o AVC veio de um problema médico da avó, que sofreu um ataque isquêmico transdórfico (AIT). “O AIT é um aviso de que, se a pessoa não se cuidar, pode ter um AVC. E pesquisando como evitar isso, vi que era um tema muito bom, com la- cunas de conhecimento”, conta o universitário.
O TCC de Gabriel, portanto, é uma revisão sistemática, isto é, uma análise de diversas pesquisas em determinada área do conhecimento. “Meu orientador não me recomendou fazer por conta do tempo, já que uma revisão sistemática não é fácil. Então, busquei orientação de uma professora da faculdade, Antoniette, e ela aceitou. Eu me dediquei 100% ao trabalho, tanto que o que deveria durar mais de um ano, consegui fazer em dois a três meses”, lembra Gabriel.
Agora, o jovem busca arrecadar recursos para apresentar o trabalho no American Heart Association Scientific Session 2025, que ocorrerá em novembro deste ano, por uma vaquinha on-line, que pode ser acessada por meio de seu instagram: @biel_glo.
Vida universitária

Depois da faculdade, Gabriel Lins vende pastéis numa barraca de feira livre, em Samambaia(foto: Ed Alves CB/DA Press)
“O Prouni abriu as portas para eu estudar em uma das faculdades mais caras de Brasília, que dá diversas ferramentas e meios para nos tornarmos bons médicos”, conta o futuro profissional, que concilia a faculdade com o trabalho desde o início da graduação. Atualmente, Gabriel faz bicos em uma pastelaria. “Eles rodam nas feirinhas daqui de Brasília. Como o curso de medicina é integral, a gente não tem muito tempo para trabalhar fixo, o jeito é sempre trabalhar à noite ou nos fins de semana”, conta.
O jovem relata ainda que o trabalho muitas vezes atrapalhou seu rendimento acadêmico. “Eu uso muito do meu tempo trabalhando e chego muito cansado depois. Então, acabo não tendo a mesma energia dos meus colegas. Nos fins de semana, eu perdia tempo de estudo”, diz.
“Como eu não queria ficar para trás, sempre mantive contato com os professores, perguntando se eu poderia acompanhar o plantão, e a maioria aceitava”, conta Gabriel, que buscou métodos alternativos para se destacar profissionalmente. Para se tornar um bom médico, o jovem foi além do conteúdo lecionado pela faculdade e buscou um programa de iniciação científica na Universidade de Brasília (UnB), onde foi bolsista e desenvolveu escrita e análise científica. Ele considera os aprendizados acadêmicos essenciais para sua conquista internacional: “Os trabalhos da faculdade, além da pesquisa na UnB, me ajudaram muito”
Apresentar pesquisas pode ser um diferencial no mercado de trabalho, defende ele, e conta que, entre seus colegas, é o único que foi aceito em congresso internacional. “Como eu pretendo seguir na cirurgia cardiovascular, acredito que ter a pesquisa no meu currículo será um grande diferencial na área”, diz Gabriel, e se prepara para realizar o internato, período prático do curso de medicina.
Apoio científico
A professora Antoinette Blackman, orientadora da pesquisa de Gabriel, apoia o esforço do estudante na realização de treinamentos e busca por cursos extracurriculares: “Na faculdade, cursos na graduação têm despertado o olhar para a pesquisa”, comenta a especialista em cardiologia, que considera essencial às atividades de especialização para a produção científica, principalmente em casos como o de Gabriel, que fazem revisão sistemática por método rigoroso de análise de dados. “Gosto muito dessa caminhada de pesquisa, interesse e busca do conhecimento”, complementa a docente.
Antoinette reforça a importância do apoio das instituições à pesquisa, e participação de congressos, com o objetivo de aprimorar as técnicas de cuidado com os pacientes e trazer novos aprendizados. Também explica o processo de submissão de trabalhos: “Busco ideias, lacunas na literatura, observações, doenças negligenciadas, desenvolvimento científico e que auxiliem na melhoria do cuidado que será oferecido aos pacientes”. E complementa: “Agradeço pelo apoio às atividades, tanto aos docentes quanto aos alunos, que são tão importantes na construção de conhecimento, aprendizado, compartilhamento e parcerias”
Faltando dois meses para o congresso nos EUA, o estudante arrecadou 50% da quantia necessária para a viagem. “Tem sido um grande desafio, já que eu nunca saí do país, nem mesmo viajei de avião. Mas a vaquinha está dando muito certo”, comemora. De acordo com Gabriel, a faculdade se comprometeu a pagar as passagens e seguro. Enquanto isso, o resto do valor vem sendo arrecadado por meio de vídeos no Instagram. “Ainda temos dois meses, e acredito que vai dar tudo certo”, finaliza o futuro médico.
» Para custear a vida acadêmica
Ministério da Educação (MEC) criou recentemente o Programa de Bolsa Permanência para alunos de medicina em vulnerabilidade socioeconômica. Os estudantes com renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo — R$ 2.277 — vão dispor de bolsa com valor definido pelo MEC, que não será inferior ao valor de R$ 700, de uma bolsa de iniciação científica. O benefício vai atingir as universidades públicas e particulares, e para participar, o estudante deve estar cadastrado no Cadastro Único para Programas Sociais do governo federal (CadÚnico).
“O Prouni abriu as portas para eu estudar em uma das faculdades mais caras de Brasília, que dá diversas ferramentas e meios para nos tornarmos bons médicos”, conta o futuro profissional, que concilia a faculdade com o trabalho desde o início da graduação. Atualmente, Gabriel faz bicos em uma pastelaria. “Eles rodam nas feirinhas daqui de Brasília. Como o curso de medicina é integral, a gente não tem muito tempo para trabalhar fixo, o jeito é sempre trabalhar à noite ou nos fins de semana”, conta.
O jovem relata ainda que o trabalho muitas vezes atrapalhou seu rendimento acadêmico. “Eu uso muito do meu tempo trabalhando e chego muito cansado depois. Então, acabo não tendo a mesma energia dos meus colegas. Nos fins de semana, eu perdia tempo de estudo”, diz.
“Como eu não queria ficar para trás, sempre mantive contato com os professores, perguntando se eu poderia acompanhar o plantão, e a maioria aceitava”, conta Gabriel, que buscou métodos alternativos para se destacar profissionalmente. Para se tornar um bom médico, o jovem foi além do conteúdo lecionado pela faculdade e buscou um programa de iniciação científica na Universidade de Brasília (UnB), onde foi bolsista e desenvolveu escrita e análise científica. Ele considera os aprendizados acadêmicos essenciais para sua conquista internacional: “Os trabalhos da faculdade, além da pesquisa na UnB, me ajudaram muito”
Apresentar pesquisas pode ser um diferencial no mercado de trabalho, defende ele, e conta que, entre seus colegas, é o único que foi aceito em congresso internacional. “Como eu pretendo seguir na cirurgia cardiovascular, acredito que ter a pesquisa no meu currículo será um grande diferencial na área”, diz Gabriel, e se prepara para realizar o internato, período prático do curso de medicina.
Apoio científico
A professora Antoinette Blackman, orientadora da pesquisa de Gabriel, apoia o esforço do estudante na realização de treinamentos e busca por cursos extracurriculares: “Na faculdade, cursos na graduação têm despertado o olhar para a pesquisa”, comenta a especialista em cardiologia, que considera essencial às atividades de especialização para a produção científica, principalmente em casos como o de Gabriel, que fazem revisão sistemática por método rigoroso de análise de dados. “Gosto muito dessa caminhada de pesquisa, interesse e busca do conhecimento”, complementa a docente.
Antoinette reforça a importância do apoio das instituições à pesquisa, e participação de congressos, com o objetivo de aprimorar as técnicas de cuidado com os pacientes e trazer novos aprendizados. Também explica o processo de submissão de trabalhos: “Busco ideias, lacunas na literatura, observações, doenças negligenciadas, desenvolvimento científico e que auxiliem na melhoria do cuidado que será oferecido aos pacientes”. E complementa: “Agradeço pelo apoio às atividades, tanto aos docentes quanto aos alunos, que são tão importantes na construção de conhecimento, aprendizado, compartilhamento e parcerias”
Faltando dois meses para o congresso nos EUA, o estudante arrecadou 50% da quantia necessária para a viagem. “Tem sido um grande desafio, já que eu nunca saí do país, nem mesmo viajei de avião. Mas a vaquinha está dando muito certo”, comemora. De acordo com Gabriel, a faculdade se comprometeu a pagar as passagens e seguro. Enquanto isso, o resto do valor vem sendo arrecadado por meio de vídeos no Instagram. “Ainda temos dois meses, e acredito que vai dar tudo certo”, finaliza o futuro médico.
» Para custear a vida acadêmica
Ministério da Educação (MEC) criou recentemente o Programa de Bolsa Permanência para alunos de medicina em vulnerabilidade socioeconômica. Os estudantes com renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo — R$ 2.277 — vão dispor de bolsa com valor definido pelo MEC, que não será inferior ao valor de R$ 700, de uma bolsa de iniciação científica. O benefício vai atingir as universidades públicas e particulares, e para participar, o estudante deve estar cadastrado no Cadastro Único para Programas Sociais do governo federal (CadÚnico).
Estagiário sob a supervisão de Mariana Niederauer
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